SÉRIE: Educação em Yoga Online – Sessão 5

SÉRIE: EDUCAÇÃO EM YOGA on-line
por
Shri. Prashant Iyengar
Quinta sessão, gravada em 25 de abril de 2020
Ramamani Iyengar Memorial Yoga Institute
Transcrição livre, traduzida por Bruna Paez, revisada por Katia Dacosta, ABIY.

Namaskar a todos vocês! Estamos na quinta sessão e hoje quero adicionar algo a yama-s e niyama-s, que discutimos na última vez.

Yama-s e niyama-s, práticas adhyatmicas

Os princípios ético-morais se apresentam enquanto estamos numa referência social e, como eu disse, o yoga não comporta nenhuma referência social; você está totalmente individualizado, personalizado, voltado para dentro. Onde está, então, o campo para praticar moralidade e ética, que pertencem ao plano do comportamento? A moralidade e a ética são os valores aparentes de uma pessoa. Nós realmente não precisamos desse valor aparente enquanto estamos em práticas espirituais, práticas adhyatmicas, práticas de yoga.

Outro ponto é que, em geral, todos nós alegamos ser moral e eticamente fortes, comparados a outras pessoas. Temos essa relatividade no conceito de moral e de ética. Somos críticos em relação aos outros e tendemos a avaliá-los em sua moral e ética, enquanto nos consideramos fortes moral e eticamente.

Outro aspecto que devemos entender sobre moralidade e ética é que, se você não está cometendo himsa, não significa que você está em ahimsa. Se você não é condescendente com asatya, não significa que você está em satya. Se uma pessoa não é má, não significa que seja uma boa pessoa; se uma pessoa não é boa, não significa que seja uma pessoa má. Uma pessoa boa deve ser uma pessoa boa. Uma pessoa boa será uma pessoa boa; uma pessoa má será uma pessoa má. Não ser mau não é ser bom; não ser bom não é ser mau.

Portanto, não ser antiético não dá nenhuma base para alegar que você é ético. Não ser imoral não dá nenhuma base para alegar que você é moral, que está em moralidade. Moralidade é moralidade, ética é ética, antiético é antiético. Não ser antiético não quer dizer que você seja ético. Não ser imoral não significa que você seja moral. Como uma pessoa que não é feia não quer dizer que seja bonita. Alguém que não é bonito não quer dizer que seja feio. Logo, com respeito a esses princípios da moral e da ética, temos que entender que existe aí uma outra perspectiva, outra dimensão. Um indivíduo pode ser uma boa pessoa e, por isso, dizer que está em ahimsa, em satya, que não recorre a asatya, que não recorre a himsa, não recorre a antagonistas…

Este é mais um ponto que reforça a afirmação anterior de que Patañjali não está lidando com princípios ético-morais, mas com princípios ético-religiosos. Por quê? Suponha que estejamos praticando ahimsa: se pensarmos que estamos em ahimsa e não cedemos a himsa, não estamos definitivamente no voto de ahimsa. Se alguém é uma boa pessoa, ela não fez o voto de ser boa, ela é simplesmente boa. Se alguém é uma pessoa nobre, é nobre por ser nobre, não quer dizer que tenha feito um voto de nobreza.

Vrata-s

Considerando isso, Patañjali embarca imediatamente no tópico de vrata-s, ou votos, tanto os votos atômicos como os grandes votos. Há dharma nos princípios de yama-s e niyama-s; há algo que se chama “voto”. Não se trata apenas de praticar satya, ahimsa, brahmacharya, asteya, saucha, santosha, tapa etc. Não é somente praticar. Se você está apenas praticando, isso não é suficiente e não foi isso que Patañjali mencionou. Ele espera que isso constitua um vrata.

Vrata significa voto, mas essa não é uma conotação adequada. Vrata é um conceito único no Sanatana Dharma. Vrata-s possuem uma proeza e um poder maiores. Vrata possui um ambiente cultural, uma sublimidade cultural na qual é possível estar em um vrata, porque vrata-s são práticas dármicas.

Por que é um achara niti dharma? Porque vrata só ocorre em dharma. Vrata não ocorre em moralidade e ética. As pessoas morais e éticas não necessariamente estão em vrata; elas precisam assumir, tornar isso um vrata. Essas observâncias devem ocorrer sob a estrutura de vrata – isso é o que se espera.

Por essa razão, Patañjali menciona vrata-s imediatamente no tópico yama-niyama-s, seja anu-vrata ou maha-vrata. Deveríamos seguir anu-vrata, não buscar nos aventurar em maha-vrata; devemos fazer votos atômicos que certamente podem ser praticados; grandes votos não podem ser praticados. Portanto, há um aspecto dármico, porque fora do dharma, não precisamos tomar nenhum vrata. Votos provêm da determinação; vrata provém das práticas dármicas. É por isso que eles são aspectos da prática do achara niti dharma, e não práticas ético-morais.

Mesmo no sutra II.28 do ashtanga yoga, Patañjali diz yoganganusthanad; anusthanam. Anusthana é traduzido como prática reverencial, mas novamente, isso não carrega a conotação apropriada. Anusthana vem apenas no karma. Há karma anushtham, jñana anushtham, mantra anushtham e yoga anushtham.

Hoje não temos consciência do yoga anushtham, estamos conscientes apenas das práticas de yoga. Assumimos que yoga é algo a ser praticado e não criamos nenhuma estrutura de anushthanam, ao passo que Patañjali, ao abordar o ashtanga yoga, fala de anusthanam: yoganganusthanad. Ele não diz “yogangapraticat”, não diz “yogangasadhanat”.

Logo, esses são todos estágios anteriores, passos que precisamos dar antes de irmos a anusthanam. Temos que ir para outras etapas preparatórias, como práticas, sadhana-s, disciplina etc. Assim, yama-niyama-s ocorrem em anusthanam, por isso há dharma. Anushthana é um termo que aparece apenas em relação a dharma, karma, jñana, mantra e yoga. Esse é outro tipo de argumento que estou apresentando para que você entenda que esses não são princípios ético-morais.

Agora, antes de ir para o próximo tópico, me fizeram uma pergunta e essa é uma questão muito importante, vital, com a qual gostaria de lidar.

Yoga e meditação

Hoje as pessoas estão fascinadas em fazer yoga e meditação. A meditação se tornou uma moda. Tanto que até os médicos prescrevem meditação para certos problemas, como questões coronárias e manejo do estresse… Assim, as pessoas estão buscando fazer meditação, todo mundo quer ir para a meditação.

O estranho é que todo mundo quer meditar, quer experimentar a meditação, mas ninguém quer saber o que é meditação. Esse é um cenário muito estranho. Quando existe essa intenção de praticar meditação, por que não se está buscando entender o que é meditação?

A pergunta que me fizeram foi que Guruji dizia com frequência que seu yoga é meditação dinâmica. Ninguém perguntou como yoga pode ser meditação. Como os asana-s ou o Iyengar yoga que está sendo praticado podem ser uma meditação dinâmica?

Comumente, meditação implica imaginar-se sentado, quieto, relaxado e, depois, fechar os olhos e fazer algo como meditação. Todos querem tentar meditar, mas é importante que saibamos o que é meditação.

O que é meditação?

A meditação é um ato psicológico e psico-mental. Primeiramente, permita-me dizer, não estou falando de dhyana. Meditação não é dhyana. Dhyana é um conceito mais amplo. A meditação é um componente de dhyana, a meditação é parte de dhyana, a meditação é uma faceta de dhyana. Não devemos equiparar meditação a dhyana. Dhyana tem um escopo mais amplo.

De qualquer forma, hoje, as pessoas não estão interessadas em dhyana, mas estão todas interessadas em meditação, particularmente o mundo ocidental, que entrou para o rebanho do yoga. Dhyana não é um termo familiar aos ocidentais. Aprendemos que dhyana é meditação e, portanto, queremos meditar, queremos ir para a meditação.

Deixe-me tentar dar uma breve explicação sobre o que é meditação: a meditação é um ato psicológico, psico-mental do cérebro, no cérebro, desde o cérebro, pelo cérebro… Por isso, é um processo psicológico, psico-mental. Isso significa que a meditação sempre terá um pensamento. É impossível não ter pensamentos e então ir meditar. A absoluta ausência de pensamentos não será meditação, é outra coisa, a que Patañjali se refere como cittavrttinirodhah – se a mente é restringida, citta é restringida, é um estado diferente. A meditação, no entanto, não é desprovida de pensamentos.

Geralmente, nós, pessoas comuns, embora apenas cônscios de um pensamento, já estamos no pensar. Nós pensamos e, então, há um pensamento. Continuamos pensando, temos um pensamento. Continuamos a pensar, temos um pensamento, temos pensamentos. Os pensamentos vêm e vão, os pensamentos têm movimentos para dentro e para fora. Pensamentos chegam, pensamentos partem. Assim, há um tráfego de pensamentos acontecendo…

Logo, enquanto os pensamentos estão ativos, mesmo em nosso estado mundano, de vigília, sempre existirá um pensamento, e então, continuaremos pensando. Mas, na meditação, isso acontece de maneira diferente. A meditação, que é um processo do pensamento, um processo do pensar, pode ocorrer apenas em esferas específicas. Não é qualquer tipo de pensamento, qualquer conteúdo de pensamento que capacita adentrar ao estado meditativo. Nem todo pensamento culminará em um estado meditativo, somente aqueles poucos pensamentos sublimes e transcendentes. É necessária uma substância de pensamento adequada para adentrar ao estado meditativo. Por isso, a “meditatividade” depende do pensamento.

Quão transcendente é o pensamento? Quão nobre é um pensamento? Quão virtuoso é um pensamento? Não é qualquer pensamento que consegue pousar na “meditatividade”.

O pensamento, o pensar e o pensador

Quando há um pensamento, há invariavelmente um pensar. Quando há um pensar, há um pensador. Portanto, há uma tríade que constitui o processo do nosso pensamento. Pode ser um pensamento não-meditativo ou um pensamento meditativo. Haverá, invariavelmente, um pensador, um pensar e um pensamento. Nós, pessoas comuns, estamos meramente acostumadas a pensar em torno de um pensamento. Temos um pensamento e, então, seguimos pensando, pensando e pensando… Há sempre um pensar sobre um pensamento. Isso nunca nos levará a um estado meditativo.

O que é meditação, então? Quando há essa formação tripartite, há o pensador, o pensar e o pensamento. Entenda as derivações da palavra, é uma palavra com três derivações: pensador, pensar e pensamento. Estamos apenas acostumados a ter um processo de pensar sobre um pensamento, nunca temos um processo de pensar sobre o pensar. Agora, é essencial que haja um processo de pensar sobre o próprio pensar, um processo de pensar sobre o próprio pensador. Temos que encontrar um pensamento, não apenas no pensamento, mas no pensar; temos que encontrar um pensamento no pensador. Logo, se apenas prosseguirmos rodeando o pensamento, flutuando com o pensar, isso não será “meditatividade”; temos que nos acostumar com um processo.

Atualmente, a meditação tem sido recomendada por qualquer um e aí achamos que temos que embarcar na meditação. Ouça atentamente o que eu digo: há um pensador, um pensar e um pensamento. Não pense apenas no pensamento, não fique pensando no pensamento. Devemos, também, investigar o próprio pensamento.

Investigue o pensamento 

Que pensamento é esse? Por que esse pensamento é necessário? De onde veio o pensamento? Qual é o conteúdo desse pensamento? Qual a esfera do pensamento? Nós devemos fazer essa investigação sobre o pensamento.

O pensamento deve ser pensado. Assim, haverá um pensamento sobre o pensamento, como: por que o pensamento veio? De onde ele veio? Como ele veio? Através de que agente eu obtive o pensamento? Qual é o propósito do pensamento? Devo continuar pensando nesse pensamento? Vale a pena pensar nesse pensamento? Portanto, o pensamento deve estar sob escrutínio. Isso está implícito na “meditatividade”.

Faça um exame minucioso do seu pensamento. Esse pensamento é bom para mim? Devo continuar tendo esse pensamento em minha mente? Ou devo eliminar esse pensamento? Esse pensamento é nocivo ou é um pensamento benéfico, nutridor e que me ajuda a evoluir?

Portanto, deve-se pensar sobre o pensamento. Deve haver um pensamento sobre o próprio pensamento, em vez de apenas pensar e ter um pensamento ao pensar. Deixe vir o pensamento. Qual é o conteúdo do pensamento? O contenedor do pensamento? O recurso do pensamento? A fonte do pensamento? O assunto do pensamento? O objeto do pensamento? O propósito do pensamento? O valor do pensamento? A importância do pensamento?

Você não vai apreciar ficar pensando em alguma coisa sobre a qual já se convenceu que é inútil pensar. Você não se engajará em um pensamento ao perceber que não vale a pena pensar nele, ou que ele está te perturbando, angustiando ou irritando. Você não continuará a incentivar o pensamento. Portanto, deve haver um escrutínio sobre o pensamento. Deve haver pensamento sobre o pensamento e não apenas o pensar no pensamento. O pensamento sobre o pensamento é o componente da “meditatividade”.

Investigue o pensar

Agora, o pensamento sobre o pensar: como estou pensando? Por que estou pensando? Quais são as ferramentas que estou usando para pensar? Porque por trás do pensar, quando o pensar acontece, há percepção, cognição, sensação, há memórias, há outros dados, há experiências… Tudo isso constitui o processo do pensar. Se não estiverem presentes, o processo do pensar não será constituído.

É preciso investigar sobre o próprio pensar: de que maneira o pensar ocorre? Quais são os dados que sustentam meu pensar? O que está subjacente ao meu pensar? Como eu acabei de dizer, haverá percepções. Você terá percepções, cognições, sensações, memórias, experiências… Tudo isso constitui o processo do pensar. Devemos ter um pensamento sobre o pensar. Esse é um componente da “meditatividade”.

Por que estou pensando? Como estou pensando? Como eu deveria estar pensando? Como eu não deveria estar pensando? Quando eu deveria estar pensando? Quando eu não deveria estar pensando?

Porque um pensamento é um bom pensamento, o pensar é um bom processo. Mas, às vezes, o lugar não é adequado, o tempo não é adequado. Logo, tem que haver um escrutínio. Essa é uma boa hora de pensar nisso? Esse é o momento certo para pensar sobre esse pensamento particular? É esse o momento, o espaço, a situação, o cenário certo?

Temos que olhar para isso objetivamente, não apenas continuar pensando, pensando e pensando. É o momento certo para pensar nisso? Talvez pensar nisso possa valer a pena, mas o tempo, o espaço e a situação podem não ser adequados. Então, temos que objetivar isso. É esse o momento, o espaço, a situação, o cenário certo para eu pensar nesse pensamento? Portanto, tem que haver o pensamento sobre o pensar.

Investigue o pensador

Agora, o pensamento sobre o pensador: qual é o estado do pensador? Estou em um estado mental adequado para estar pensativo ou ter um processo do pensar? Estou aborrecido? Estou atormentado? Estou com raiva? Eu tenho preconceitos?

Não faz sentido ter um processo do pensamento quando você tem preconceitos sobre o que você está pensando. Desse modo, temos também que investigar o pensador.

O pensador está no estado de espírito certo para pensar sobre esse pensamento aqui e agora? O pensador está em um estado de espírito adequado? O pensador tem o perfil adequado? É um perfil adequado para estar pensativo?

Se existe um estado contrariado, atormentado, angustiante ou a condição de erupção de alguma doença, preconceitos etc., então, não é o momento certo para pensar, o pensador não deveria estar pensando. O pensador deveria começar a ser um pensador em outro momento, sabendo que não está no estado de espírito adequado.

“Meditatividade”

“Meditatividade” significa, principalmente, ter pensamentos sobre o pensador e ter pensamentos sobre o pensar isso é tão importante. E, ainda, ter pensamentos sobre o próprio pensamento, analisar os pensamentos, ao invés de apenas pensar, pensar e pensar…

Você deve analisar os pensamentos, pois os pensamentos podem ter um potencial de estresse, de tensão, ansiedade, preocupação, atormentação… Você quer se afastar desses tipos de pensamentos, pois eles perturbam a mente.

O pensamento deve ser analisado, escrutinado. Similarmente, o pensar deve ser escrutinado e o pensador deve estar sob escrutínio. Pensar no pensador é um componente meditativo. Pensar no pensador, ao invés de pensar no pensamento. Mais que um simples processo mundano de meramente ter um processo do pensar e um objeto do pensamento, o pensar sobre o pensar é um componente meditativo.

Você perceberá que, para a “meditatividade”, você terá que selecionar um objeto ou conteúdo do pensamento adequado. Nem todo conteúdo do pensamento será capaz de levá-lo à “meditatividade”. Logo, tem que haver uma filtragem do pensamento. O pensamento deve ser adequado. Então, o processo do pensar deve ser escrutinado, para que possa evoluir, ser corrigido, afinado, sintonizado… Da mesma forma, o pensador.

Resumindo, se eu tiver que dar apenas uma definição de meditação, essencialmente, [diria que] essa é da natureza de (1) pensamentos sobre o pensador; (2) pensamentos sobre o pensar, no segundo estágio; e (3) pensamentos sobre o pensamento. A evolução se dará de maneira inversa: pensamentos sobre o pensamento, pensamentos sobre o pensar, pensamentos sobre o pensador. Logo, essa é uma fase culminativa, uma fase reflexiva. O pensador deve ser conhecido, objetivado, avaliado, investigado, escrutinado.

E um tema ióguico é o melhor tema para ir à “meditatividade”.

Iyengar yoga e “meditatividade”

Agora, por que Guruji chamou seu processo, seu yoga, como meditação dinâmica? Deixe-me esclarecer: Iyengar yoga não é meditação dinâmica; o yoga do Iyengar era meditação dinâmica. Portanto, nós, estudantes de Iyengar, não devemos ser complacentes, achando que estamos fazendo Iyengar Yoga e que Iyengar Yoga é meditação dinâmica. O yoga de Guruji é que era meditação, porque o yoga, yogasana-s são condições maravilhosas para entrar na academia da “meditatividade”.

Onde há a abordagem do corpo, da respiração e da mente, a entidade subjetiva é propriamente ajustada, o objeto dos asana-s é ajustado, as entidades instrumentais são ajustadas. Classicamente, numa interpretação “asanica”, há uma entidade subjetiva, uma entidade objetiva, uma entidade instrumental.

Às vezes, a entidade subjetiva se origina da vontade do “sou”. Isso acontecia com Guruji em suas práticas. Ele não estava apenas buscando aperfeiçoar seu Sirsasana. Ele estava obtendo sua entidade subjetiva na vontade do “sou”, na mesa de operação, e entalhava, esculpia e cultivava a entidade subjetiva.

Dessa forma, ele objetivava a entidade subjetiva. A isso chamamos “testemunhidade”, auto-testemunho, testemunhar a si mesmo. Logo, em seu yoga, Guruji aplicava o auto-testemunho e, consequentemente, corrigia sua entidade subjetiva; ao passo que nós confundimos o processo e apenas seguimos corrigindo o nosso Sirsasana, o nosso Sarvangasana, o nosso Trikonasana, sem buscar corrigir a nós mesmos em um perfil subjetivo, embora seja essa a implicação de um asana. Guruji faria isso. Em qualquer asana haveria um processo do pensamento. Isso é um processo de pensamento adhyatmico.

Geralmente, em nosso objeto do pensamento ou no processo do pensar, existe algum elemento externo entrando, enquanto que, no yoga, não existe nenhum elemento externo entrando. O fazedor, o fazer e o feito são todos integralmente um só.

Então, nos yogasana-s, existe algo chamado karma-kriya, jñana-kriya e dhyana-kriya.

Guruji não tinha apenas o seu asana sob escrutínio, mas tinha também os seus instrumentos sob escrutínio. Qual é o sentido de fazer um Sirsasana perfeito para ser visto de qualquer maneira? Portanto, a instrumentação deve ser adequada e deve estar sob escrutínio. Como eu estou indo? Como os instrumentos estão sendo usados? Eles são usados justificadamente? Eles são usados corretamente?

Nós queremos apenas fazer o asana perfeitamente. Não nos preocupamos com os instrumentos, porque achamos que asana é uma postura e a postura é algo espetacular, um espetáculo. Buscamos trabalhar em um asana como um espetáculo, sem nos preocuparmos com o que fazemos por dentro, sem nos preocuparmos com os processos; queremos apenas aperfeiçoar o asana.

Guruji faria o processo do pensar sobre os instrumentos. Guruji faria o processo do pensar na entidade subjetiva. Na “meditatividade”, você obtém reflexões. Por isso, nas funções facultativas superiores, o processo é de “pensividade”, “reflexividade”, “meditatividade”. Se não há reflexividade e não há reflexão, você não pode meditar.

Você não medita em um pensamento, você medita na reflexão do pensamento. Você medita na reflexividade. Se não houver reflexividade, você não poderá meditar. A pensividade deve estar lá. Essas são funções facultativas superiores. Por essa razão, eu disse desde o princípio que esses são processos psicológicos e psico-mentais.

A “meditatividade” sai da pensividade, reflexividade, meditatividade, mas atrapalhamos a nossa compreensão. Achamos que, primeiro, devemos nos concentrar. Temos a ideia, a noção de que a concentração conduz à meditação, por isso a tríade “concentração, meditação e transe” – isso não está certo, isso é falho.

A concentração nunca lhe dará “meditatividade”. A concentração é sempre sobre um objeto. Você consegue imaginar a concentração sem um objeto sensorial? Você deve ter um objeto sensorial para se concentrar. Sem um objeto sensorial, você não pode se concentrar. A concentração é psico-sensorial, o que elevará a concentração para o estado de envolvimento e de absorção. Você pode estar absorvido em um objeto sensorial.

Nós erroneamente introduzimos a meditação como um elo, por causa da tradução equivocada de dharana, dhyana, samadhi, como concentração, meditação, transe. Dharana não é concentração; dhyana não é, nesse sentido, meditação; samadhi, não é transe, nesse sentido. Eles acontecem progressivamente na esfera psico-mental, mas nós introduzimos a meditação como um elo, o que é equivocado, o que é um erro. Por isso, a educação [em yoga] é importante, para ter cristalizações apropriadas.

De onde vem a meditação? Ela vem em funções facultativas superiores – pensividade, reflexividade, “meditatividade”. Para que ocorra a “meditatividade” deve haver reflexividade; o objeto deve ser digno de reflexão. Se o objeto não for digno de reflexão, você não pode ir à “meditatividade”. A pensividade, a reflexividade e a “meditatividade” são produzidos pelo processo do pensamento pensamento, pensar, pensador. Identifique-os, classifique-os, reconheça-os.

Então, em que consiste essa produção? O pensamento sobre o pensamento, o pensamento sobre o pensar e o pensamento sobre o pensador, e de novo, o pensamento sobre o pensamento, o pensamento sobre o pensar e o pensamento sobre o pensador e então, novamente… Esse processo circular, rotativo instiga a produção [da pensividade] e a reflexividade e a meditatividade evoluem a partir daí.

Um ponto a ser observado aqui, desde a dimensão da perspectiva educacional [em yoga]: a “meditatividade” não vem da concentração. Você não precisa da concentração para meditar. Você precisa de um objeto bom, nobre, de um objeto adequado para tecer o pensamento ao redor dele. Porém, nem todo objeto possibilita ir para a “meditatividade”. Em seguida, você deve prosseguir à dissecação do pensador, do pensar e do pensamento. Se me permitem dizer, “trissecção”: a trissecção do pensamento, do pensar e do pensador. Identifique, objetifique, analise, investigue, examine cada um deles. Vá fazendo isso ciclicamente e você chegará na “meditatividade”.

O yoga de Guruji era um processo meditativo dinâmico ou meditação porque sua abordagem era desde o centro até a periferia, da periferia aos aspectos centrais; todos os aspectos do “eu” e do “meu” surgindo como entidades objetivas, entidades instrumentais e entidades subjetivas. Assim, havia o pensamento sobre o pensar e o pensamento sobre pensador. Isso nem é ainda um processo meditativo. Guruji não estava apenas aperfeiçoando asana-s, mas estava buscando entalhar, esculpir e também abordar, ajustar, as entidades instrumentais e subjetivas e, por isso, havia meditatividade em seus asana-s.

Como embarcar nesse processo em sua prática? 

Nas suas práticas, busque entender a sintaxe a que eu me referi na última vez: estou fazendo Trikonasana; Trikonasana está sendo feito; Trikonasana está sendo feito em mim; Trikonasana é feito pela respiração e pela mente; Trikonasana é feito para a respiração e para a mente; estou fazendo Trikonasana; Trikonasana é feito em mim. Esse processo clássico trará o horizonte da “meditatividade” ao seu processo e você começará a compreender como um asana pode ser um estado meditativo.

Veja, em asana-s, vamos a um estado mental e um estado mental é sempre um padrão de pensamento. Você não pode ter um bom estado mental sem um padrão de pensamento. Esquema de pensamentos, disposição de pensamentos, conteúdo do pensamento eles devem estar lá, por trás do estado da sua mente. Assim, em processos naturais, orgânicos, ióguicos, um estado mental tem sempre um padrão de pensamento subjacente e uma estrutura de pensamento erguida sobre ele.

Somente em processos inorgânicos você pode ter um estado mental sem um substrato de pensamento. Por exemplo, se você toma uma pílula, uma droga psicodélica, você não precisa de um esquema de pensamento para ter esse estado psicodélico a droga o promove. Esse é um processo inorgânico, não um processo natural.

No yoga, você trabalha no seu estado mental de forma muito natural, orgânica e autogênica. Portanto, tenha em mente que há sempre um padrão, um esquema e uma disposição de pensamento por trás do estado mental. Sirsasana ou Savasana não são uma pílula psicodélica dos quais você obtém esse estado sublime. Isso é produzido autogenicamente, bioquimicamente, eletroquimicamente.

Sempre há o pensamento e o processo do pensamento. Por isso que, em asana-s, introduzi o preceito do processo de atividade e processo do pensamento. O homem leigo, comum, e a maioria dos praticantes também pensa que o yoga é um processo de atividade. Eles se perdem nesse processo de atividade e não identificam o processo do pensamento. Introduza o processo do pensamento. Introduza-o significativamente. Haverá bases para a “meditatividade”.

A “meditatividade” não se baseia na atividade, a “meditatividade” se baseia no pensamento. Vamos buscar melhorar os processos do pensamento em asana-s! Vamos objetivar os processos do pensamento. Vamos examinar minuciosamente esses processos. Vamos buscar abordar e melhorar os processos do pensamento. Então, certamente estaremos caminhando para a “meditatividade” e a meditação dinâmica do sistema Iyengar.

Eu acho que isso é suficiente para hoje. Muito obrigado pela sua paciência. Namaskar!

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